15 de outubro 2014

Povos Pankararu e Xokó finalizam a primeira etapa do processo de elaboração dos seus PGTAs

As atividades entre os Pankararu e os Xokó incluíram oficinas de mapeamento com caminhadas pelos territórios e conversas com os anciões e conhecedores de assuntos específicos.

Terminaram no final de setembro, as ações de mapeamento territorial e ambiental das Terras Indígenas (TIs) Entre Serras, do povo Pankararu, em Pernambuco, e Caiçara/Ilha de São Pedro, do povo Xokó, em Sergipe. As atividades estão sendo conduzidas pela Anaí (Associação Nacional de Ação Indigenista), que por meio de uma parceria com o Projeto GATI, Funai, PNUD e GEF, apoia essas TIs na realização de diagnósticos participativos, focados no mapeamento territorial e na elaboração de PGTA’s (Planos de Gestão Ambiental e Territorial). É por meio de ações como essa, que o Projeto GATI e parceiros efetivam suas contribuições no fortalecimento do papel dos indígenas na conservação e proteção da Caatinga, um dos biomas brasileiros com rica biodiversidade, porém extremamente ameaçado pelo desmatamento e uso desenfreado dos recursos naturais, especialmente pelos não indígenas.

Os PGTA’s são importantes instrumentos de planejamento do uso dos territórios indígenas e de seus recursos. Sua construção promove a reflexão para a utilização sustentável dos recursos naturais, e fornece subsídios para orientar políticas públicas ambientalistas e indigenistas. As atividades entre os Pankararu e os Xokó incluíram oficinas de mapeamento com caminhadas pelos territórios e conversas com os anciões e conhecedores de assuntos específicos. Também foram feitas oficinas de vídeo para assim registrar o processo em diversos formatos. As atividades foram acompanhadas pela consultora regional do GATI para o Núcleo Nordeste 1, Isabel Modercin.

Em Entre Serras, elaboração participativa de etnomapas. ©Marcelino/Anaí

Como foi a primeira etapa?

Em agosto e setembro, técnicos da Anaí percorreram os territórios Xokó e Pankararu, mapeando elementos e aspectos da paisagem considerados relevantes pelos indígenas para a discussão entre as comunidades sobre a gestão dos seus territórios.

Na TI Caiçara/Ilha de São Pedro, as oficinas contaram com a participação majoritária de jovens que se organizaram em grupos temáticos de pesquisa para levantar a situação do território através de caminhadas, entrevistas e elaboração participativa dos mapas. As pesquisas também geram registros em vídeo, que foram exibidos na comunidade em sessões de cinema.

Em Entre Serras, as oficinas contaram com a participação mais expressiva de adultos e anciões. Nesses encontros foram produzidos mapas das aldeias, estradas, empreendimentos que afetam a TI, corpos d’água, áreas de floresta, serras, depósitos de lixo, projetos de desenvolvimento local, conflitos, entre outros elementos levantados.

Visita às áreas de florestas do território Xokó. ©Anaí

O rio São Francisco e a degradação ambiental

Entre as questões mais destacadas pelos Xokó e pelos Pankararu está a situação do acesso e conservação da água, sendo a sua maior fonte o rio São Francisco. Os indígenas compararam a situação de 20 anos atrás com os dias de hoje, e concluíram que por conta da degradação ambiental, o nível do rio vem baixando vertiginosamente em virtude do barramento das águas por grandes empreendimentos hidrelétricos e construção de canais de irrigação. Localizado nas margens do São Francisco, o território Xokó, por exemplo, tem suas lagoas complemente secas há mais de 10 anos, sendo que antes as mesmas eram usadas para pesca indígena de subsistência.

Os Xokó também enfatizaram no seu levantamento os impactos ambientais relacionados principalmente ao tratamento inadequado de resíduos sólidos, afetando o rio que abastece as casas das famílias da TI. Como consequência, é comum na região, crianças menores de cinco anos ficarem doentes, com diarreia e verminose. Igualmente foram mapeadas áreas de invasão por caçadores e locais de retirada ilegal de madeira.

Margens do Rio São Francisco na TI Caiçara/Ilha de São Pedro. ©Anaí

Questões territoriais

Um das questões que mais aflige o povo Pankararu é a situação jurídica do seu território, referente aos limites da demarcação que deixou de fora o acesso ao rio São Francisco.  As margens do velho Chico sempre foram usadas para pesca de subsistência e práticas culturais. Essas áreas hoje são ocupadas por propriedades privadas. Além disso, várias aldeias sofrem com a falta de água, mesmo estando há menos de 6 km de distância do rio.

Outro desafio enfrentado pelos Pankararu é a ocupação do território homologado por posseiros. O processo de desintrusão não acontece e a maior parte do território, incluindo as melhores terras para o cultivo, ainda se encontram nas mãos de não índios.

Conservação de espécies da flora e uso dos territórios

O exercício de mapeamento, especialmente das áreas de floresta, roças, áreas de coleta e caça, levantou questões diretamente relacionadas ao modo de vida das comunidades e as transformações internas e externas que afetam as novas gerações. Os participantes analisaram imagens de satélite da área da década de 80 e imagens atuais. Comparando as mudanças no uso do solo, debateram a relação inseparável da natureza com o homem e novos desafios a serem enfrentados, a exemplo de “como sobreviver do território e mantê-lo preservado?”; “como gerar renda para os jovens sem que eles tenham que deixar o território?”

Entre os Pankararu existe a expectativa de que o PGTA trate do manejo do caroá que é uma bromélia nativa das matas da Caatinga, utilizada para a confecção dos “praiás”, vestes tradicionais usadas em rituais. Para fazer um praiá são necessárias 120 dúzias de caroá. Como o povo Pankararu é muito ligado aos seus rituais, teme-se que haja uma sobre exploração da planta, tornando-a escassa na região. Segundo os mesmos, “sem caroá, não tem tradição”. Por isso, a ideia é que por meio do mapeamento possam ser identificadas as áreas de coleta do caroá, para dimensionar a área de ocorrência e produzir informações para embasar a elaboração de um plano de manejo da planta.  

Visita às áreas de caroa na TI Entre Serras. ©Anaí

Próximos passos

Durante essa primeira etapa muita informação foi produzida através da produção de mapas, análise de imagens de satélite, georreferencimento, entrevistas e grupos de discussão. Esse material será sistematizado pela equipe da Anaí para na segunda etapa, a partir de novembro, ser apresentado à comunidade e assim subsidiar discussões sobre indicativos de usos e acordos em relação à gestão ambiental e territorial das TIs Entre Serra e Caiçara/Ilha de São Pedro.

Saiba Mais

Assista aos vídeos que registram o processo de mapeamento na:

TI Entre Serras

TI Caiçara/Ilha de São Pedro