14 de maio 2014

Rio São Francisco é homenageado na abertura do primeiro Módulo do Curso Básico de Formação em PNGATI para o Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo

Durante a abertura oficial do Curso Básico de Formação em PNGATI para o Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo, no dia 12/05, indígenas homenagearam e dedicaram o primeiro módulo ao “Velho Chico”. O curso vai até 16/05 e está acontecendo em Petrolândia, estado de Pernambuco, cidade localizada às margens do rio São Francisco.

Diversas autoridades indígenas e não indígenas estiveram presentes na  abertura oficial do Curso, dentre elas: o prefeito de Petrolândia, Lourival Simões; o Secretário Municipal de Assuntos Indígenas, Ubirajara Pankararu; o representante da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado de Pernambuco, Adelmar Júnior; o coordenador da Coordenação Regional da Funai do Baixo São Francisco, Carlos Roberto dos Santos; o representante da Coordenação Geral de Gestão Ambiental da Fundação Nacional do Índio, João Guilherme Cruz; o consultor pedagógico para formação do Projeto GATI – PNUD/GEF/Funai (Gestão Ambiental e Territorial Indígena), Henyo Barretto; o chefe da Rebio de Serra Negra, Diego Monteiro, do Instituto Chico Mendes para Conservação da Biodiversidade; líderes da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME), Uilton Tuxá e Ceiça Pitaguari; e lideranças do povo Pankararu, Marcelo Pankararu e Sarapó Pankararu. 

Todos os convidados relembraram a importância da realização do curso como implementação da PNGATI na região Nordeste e os esforços da APOINME e suas bases, na luta pelo reconhecimento dos direitos dos povos indígenas. “Sou muito feliz em dizer que fiz parte da construção da Política, junto com as lideranças do Nordeste", informou o cacique Marcelo Pankararu da Terra Indígena (TI) Entre Serras.

João Guilherme da CCGAM/Funai disse que “é importante que todas as esferas do Governo Federal, Estadual e Municipal, se apropriem desse importante instrumento legal de promoção ao desenvolvimento sustentável e direitos indígenas que é a PNGATI”. Em relação ao Curso, o mesmo ressaltou que a proposta metodológica enfatiza o diálogo entre os indígenas, governo e sociedade civil organizada na busca de estratégias de promoção da gestão ambiental das TIs. Guilherme observou ainda que o formato itinerante escolhido para a formação (saiba mais), apesar de desafiante, “promove o debate em âmbito local, fortalecendo assim o movimento indígena e o diálogo deste com outras instâncias relevantes para a implementação da PNGATI, tais como os Comitês Regionais da Funai e as coordenações regionais do ICMBio”, disse.

Diego Monteiro, chefe da Reserva Biológica de Serra Negra (ICMBio), falou da importância da realização do curso e que acredita que os povos indígenas têm muito a ensinar sobre  gestão ambiental. “É muito bom trocar ideias com quem já faz gestão ambiental há mais de 500 anos de história”, afirmou. 

Fala de Uilton Tuxá (APOINME), durante abertura do evento. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI
Fala de Uilton Tuxá (APOINME), durante abertura do evento. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI

Uilton Tuxá, coordenador da APOINME, afirmou que a realização do Curso é um marco histórico que concretiza um sonho realizado. “Apesar de diversas atividades já estarem acontecendo em âmbito de gestão ambiental e territorial, eu considero esse Curso a primeira atividade oficial em contexto de PNGATI”. O coordenador também falou da importância do rio São Francisco para a vida dos povos indígenas do Nordeste. “O rio São Francisco acolhe na sua bacia 32 povos indígenas, por isso ele nos une.” Tuxá afirmou ainda que apesar do rio vir sendo agredido brutalmente pela gana do crescimento econômico do país, o “Velho Chico” permanece um importante símbolo que fortalece a tradição religiosa dos povos do Nordeste ao longo dos séculos. “Gostaria de pedir licença a todos para dedicar a realização desse primeiro módulo ao nosso rio São Francisco”, clamou Tuxá.

Como entendemos o conceito de “desenvolvimento”?

Os cursistas iniciaram o módulo discutindo o que é desenvolvimento e bem viver, a relação entre os povos indígenas com o Estado brasileiro e sociedade envolvente, e os grandes empreendimentos que impactam os povos e as terras no Nordeste, como a construção de barragens e a transposição do Rio São Francisco. Nesse sentido, o antropólogo convidado, Parry Scott, da Universidade Federal de Pernambuco, e estudioso do tema dos grandes projetos de infraestrutura e desenvolvimento, chamou essas obras de “projetos de investimentos” ao invés de “desenvolvimento”. Pois estas iniciativas operam no que ele chamou de produção de “vocações”, que seriam, na verdade, justificativas para investimentos massivos em infraestrutura e tecnologia. 

Os cursistas Toninho Guarani e Carolina Ferreira (ICMBio) discutindo o conceito de
Os cursistas Toninho Guarani e Carolina Ferreira (ICMBio) discutindo o conceito de "desenvolvimento". Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI

O professor também abordou os efeitos positivos provocados pelos impactos negativos das obras, como exemplo, o surgimento dos movimentos de mobilização e resistência e de fortalecimento da identidade da população afetada. E assim o surgimento de projetos alternativos de desenvolvimento na região. Scott também aponta para o risco desses movimentos, associações indígenas ou sindicatos, serem incorporados na burocracia e passarem a operar como braço  administrativo do empreendimento.

O antropólogo convidado Wilke Torres de Melo, do povo Fulni-ôh, levantou a importância dos povos indígenas sempre invocarem os seus ancestrais, não apenas como ritual, mas como fortalecimento e efetividade dessas práticas, que devem ser aprendidas do jeito que são, sem serem “manualizadas” pelos livros e guias etc.  Ele também levantou que o bem viver nos territórios indígenas estaria ligado  à liberdade dos povos praticarem sua cultura, crenças e viver próprios. E ao mesmo tempo, esse debate se estende à capacidade de organização e mobilização política do movimento indígena. “Não tem como discutir a PNGATI sem discutir as organizações políticas das nossas comunidades internamente. É importante fazermos essa reflexão e levá-la até às bases”, afirmou.

Foi exibido também o vídeo “Elefante Branco – Resistência Indígena à Transposição do Rio São Francisco” (VEJA AQUI) que narra os movimentos de resistência dos povos indígenas do Nordeste contra os grandes empreendimentos na bacia do rio São Francisco. E para celebrar o início do Curso, houve ainda a apresentação Grupo Cultural Nação Pankararu.

Apresentação da Dança do Búzio do Grupo Cultural Nação Pankararu. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI.
Apresentação da Dança do Búzio do Grupo Cultural Nação Pankararu. Foto: ©Andreza Andrade/Projeto GATI.

Saiba mais

O curso é uma realização da Fundação Nacional do Índio (Funai), por meio da Coordenação Geral de Gestão Ambiental (CGGAM), do Ministério do Meio Ambiente (MMA), do Instituto Chico Mendes para a Biodiversidade (ICMBio), do Projeto GATI – PNUD/GEF/Funai (Gestão Ambiental e Territorial Indígena). Conta ainda com o apoio da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME), das Coordenações Regionais Nordeste I e II, Baixo São Francisco, Sul da Bahia e Minas Gerais e Espírito Santo da Funai, da Coordenação de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado de Pernambuco, da Prefeitura Municipal de Petrolândia e da Cooperação Alemã para o Desenvolvimento (GIZ).

Participam 29 indígenas dos povos Fulni-ô, Guarani, Kiriri, Maxakali, Pankararu, Pataxó, Pataxó Hã-hã-hãe, Pitaguari, Potiguara, Tapeba, Tingui-Botó, Tremembé, Tupinambá, Tupiniquim, Tuxá, Xacriabá, Xokó e Xukuru; e ainda 14 servidores públicos de três Coordenações Regionais do Instituto Chico Mendes para a Biodiversidade (ICMBio), cinco Coordenações Regionais da Fundação Nacional do Índio e da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado de Pernambuco.

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