10 de abril 2014

Cursistas do Sul e Sudeste debatem “Cultura e Natureza”, durante 2º Módulo do Curso Básico de Formação em PNGATI

Participaram 27 cursistas, sendo 16 indígenas e 11 gestores públicos.
Turma do Sul e Sudeste, do Curso Básico de Formação em PNGATI - Bioma Mata Atlântica.
Turma do Sul e Sudeste, do Curso Básico de Formação em PNGATI - Bioma Mata Atlântica.

Entre os dias 24 e 28 de março, na Academia Nacional da Biodiversidade-AcadeBio, situada na Floresta Nacional de Ipanema, em Iperó-SP, aconteceu o segundo módulo do Curso Básico de Formação em Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI) para o Bioma Mata Atlântica Sul e Sudeste, tendo como tema “Cultura e Meio Ambiente”. Participaram 27 cursistas, sendo 16 indígenas dos povos Guarani, Kaingang, Xokleng Laklãnõ, Terena e Xetá, e 11 gestores públicos vinculados à Fundação Nacional do Índio (Coordenações Regionais de Passo Fundo, Interior Sul, Litoral Sul e Litoral Sudeste), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (Coordenações Regionais em Florianópolis-CR9 e Rio de Janeiro-CR8), Secretaria de Educação (SEDUC) e Coordenadoria de Assistência Técnica Integral da Secretaria de Agricultura e Abastecimento (CATI) do Estado de São Paulo. Também participaram como instrutores antropólogos que estudaram esses povos, tais como Ricardo dos Campos Leinig (SEGAT/CR Litoral Sul/Funai), Flavio Braune Wiik (UEL) e Rogério Reus Rosa (UFPel).

A mesa de abertura do módulo contou com a presença de Tatiana Rehder, da Diretoria de Ações Socioambientais e Consolidação Territorial em Unidades de Conservação (DISAT/ICMBio); Alexandre Cordeiro, da FloNa de Ipanema (ICMBio); João Guilherme Nunes Cruz, da Coordenação Geral de Gestão Ambiental/Funai; e Luiz Gustavo Galvão, do Ministério do Meio Ambiente. Nas suas falas, todos destacaram a importância estratégica do Curso como um espaço de formação política, de construção coletiva, de diálogo intercultural e de aprendizado mútuos voltados à qualificação dos diferentes atores comprometidos com a implementação da PNGATI em contextos socioculturais e territoriais concretos. 

Sabedores indígenas compartilhando seus conhecimentos tradicionais com os cursistas. ©Foto: Ricardo de Campos Leinig

O módulo foi organizado em torno de três eixos: 1) a relação entre culturas indígenas, natureza e meio ambiente; 2) as visões ocidentais da relação cultura, natureza e meio ambiente; e 3) as implicações dessas diferentes percepções para a discussão sobre gestão territorial e ambiental de terras indígenas. Nesse módulo, houve a participação de anciãos indígenas, tais como: o xeramoi (autoridade espiritual) Timotio Karai Mirin de Oliveira (Guarani Mbyá), o kujà (xamã) Jorge Kagnãg Garcia (Kaingang) e o senhor Veitcha Uvanheccu Teie – estes dois já com mais de 90 anos de idade; além do professor Claudemir Xetá. Em rodas de conversa ao ar livre, os anciãos puderam compartilhar um pouco do seu vasto repertório de conhecimentos ancestrais e dos modos de como os seus povos constroem os seus mundos. 

Da esquerda para direita, os anciãos Jorge Kagnãg Garcia (Kaingang) e Veitcha Uvanheccu Teie (Xokleng). Foto: ©Ricardo de Campos Leinig

Os cursistas também revisitaram o Eixo 6 da PNGATI, sobre os conhecimentos tradicionais e o patrimônio genético associado à biodiversidade. A bióloga Maira Smith (CGGAM/Funai), conduziu o assunto e enfatizou como as sementes, os frutos e certas florestas são produtos e paisagens culturais. 

Além disso, foram abordadas as narrativas modernas ocidentais da natureza infinita e da natureza intocada, com as visões mais críticas e interativas de alguns pensadores não indígenas (filósofos, biólogos e ambientalistas), que apresentam alguns pontos de contato com as perspectivas indígenas. Esses temas foram tratados por meio de dinâmicas que envolveram visitas guiadas a atrativos da FloNa de Ipanema (a Casa de Armas Brancas e os fornos da antiga siderúrgica), exibição de vídeos e trabalhos de grupo em torno de textos geradores. 

Mauro Leno Silvestrin, indigenista da Funai CR de Passo Fundo, informou que o curso está sendo de grande valia, pois permite o intercâmbio entre instituições e destas com os indígenas, para que juntos pensem uma política de gestão mais próxima à realidade dos povos. “Esse módulo em especial, deixou isso bem claro com a participação dos sábios Xetá, Xokleng, Guarani e Kaingang, que nos demonstraram como para esses povos não há a separação entre as esferas natural/cultural/espiritual e que ao se pensar a gestão deve se levar em consideração esse caráter sociocosmológico do território”, afirmou. 

O professor Rogério Rosa (UFPel), definiu a sua contribuição ao módulo como “destacar, a partir da perspectiva da etnologia indígena e da mitologia, algumas conexões entre o saber dos velhos e das novas gerações, a ordem da oralidade e da escrita, o conhecimento oriundo da floresta e o da ciência (universidade), a conexão entre a cosmologia indígena e as políticas públicas pensadas pelo Estado brasileiro, a importância da ordem espiritual, das narrativas mitológicas e da sabedoria dos anciãos para gestarmos o bem-estar dos indígenas.” 

Para Marciano Rodrigues, indígena Guarani e coordenador da ArpinSul (Articulação dos Povos Indígenas do Sul), a participação dos anciãos indígenas foi fundamental para mostrar que as populações indígenas do sul e sudeste detém muitos conhecimentos que a cada dia têm se limitado e esbarrado nos novos conceitos e praticas contemporâneas, mesmo dentro das comunidades. “As influências externas têm, de certa forma, contribuído para desvalorizar os conhecimentos, práticas e espiritualidade indígenas, mas mesmo assim vimos diante de tudo a forte resistência, principalmente através de iniciativas próprias, para que não se acabe o modo de pensar e viver indígena”, afirmou o coordenador.  Após a conclusão do 2o módulo, todos os cursistas estarão desenvolvendo tarefas a serem apresentadas no 3o módulo, cuja data de realização será de 02 à 06 de junho, e tem como tema “Poder e Sustentabilidade dos Povos e Terras Indígenas”.

 

Saiba mais...............................

O que é o Curso Básico de Formação em PNGATI? 

 

É um componente do Programa de Formação Continuada em PNGATI, que visa qualificar gestores indígenas e gestores públicos da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Ministério do Meio Ambiente (MMA), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e órgãos afins, para atuarem diretamente nos processos de implementação da PNGATI. Este objetivo está traduzido na Meta do PPA 2012-2015, compartilhada por Funai e MMA, de formar 300 gestores indígenas e 300 gestores não indígenas responsáveis por contribuir com a qualificação de ações de gestão territorial e ambiental de Terras Indígenas. A formação para o Bioma Mata Atlâtica Sul e Sudeste é uma iniciativa conjunta do ICMBio, MMA e Funai, e conta com o apoio da ARPIN-Sul (Articulação dos Povos Indígenas do Sul), ARPIN-Sudeste (Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste), GIZ (Cooperação Alemã para o Desenvolvimento), Projeto GATI (Gestão Ambiental e Territorial Indígena) e da própria AcadeBio.

Leia a notícia sobre o primeiro módulo: Gestores da Funai e ICMBio participam do primeiro módulo da formação “Entendendo a PNGATI”